28 de novembro de 2012

Vim, vi e consegui voltar

Foi uma noite belutesca. Os famosos altos e baixos que dão as caras desde que Thomaz Bellucci disputa os principais torneios da ATP puderam ser vistos de perto. Pior que estejam tão presentes nas últimas – e raras – atuações frente ao público brasileiro – ATP Challenger Tour Finals de 2011, Brasil Open e agora o Challenger Finals da temporada atual. Ou pré-temporada...


Um atendimento depois de 3 games para re-remendar a mão esquerda. Um primeiro set de trocas de bola do fundo de quadra e o argentino Guido Pella, também canhoto, aceitando encarar as cruzadas de forehand com o número 1 brasileiro. No backhand ficava claro que o classificado sem convite não conseguia empurrar Bellucci para o fundo ou deslocá-lo suficientemente para as laterais. 1 set a 0.

Uma quebra no game inicial do 2º set. E aí começou. Pella devolve a quebra imediatamente e tem break point para abrir 3/1. A postura e a movimentação de Bellucci são diferentes das do início do jogo. E as emoções dos presentes também. Se no primeiro set pontos bonitos vencidos por Pella eram recebidos com slow claps entre duas ou três pessoas espalhadas pelo Ginásio do Ibirapuera, agora a torcida passou a ser público, se esqueceu de que “ganhar de argentino é melhor” e aplaudem o que precisa ser aplaudido. Não que torçam contra Bellucci. Os pontos e momentos delicados para o brasileiro têm volume – e gritos – muito maior. Talvez porque tenham sido muitos momentos delicados.

No tie-break, Pella erra um voleio curto que dificilmente Bellucci chegaria na bola, o que o deixaria com vantagem de 4/1. Público inflamado, já que o brasileiro devolveu o mini break. A torcida estava lá. No ponto seguinte, um erro não forçado de forehand do brasileiro para fora – de onde eu estava, bem fora. Uma leve reclamação de Bellucci com o árbitro e tímidas vaias dão as caras. Para a escolha da jogada em um ponto importante? Para o erro? Para a reclamação? Por que acharam que a bola foi dentro? Não descobri. Mas os longos aplausos voltam dois pontos depois, em um ponto... do argentino! Um grande voleio para abrir 6/3 no tie-break e, depois, aproveitar o terceiro set point. Nesse momento, muita gente deixa o Ibirapuera, ao que retornarei linhas abaixo (vídeo aqui).

Com o público desfalcado, Bellucci abre 3/0 e parece recolocar a vitória certa em curso. No sétimo game, três break points para abrir 5/1(!). Não aproveitados. Pella confirma, quebra e confirma para empatar o set decisivo por 4/4. Bellucci no saque com 40/15 antes de um longo e dramático nono game. Na sequência, Pella volta a igualar o set após um slice angustiante do brasileiro. Reflexo, não só de como estava o físico ou o psicológico do convidado, mas do que virou o jogo. E o 5/5 veio para coroar, com Bellucci sacando em 15/40 antes de enfrentar infinitos break points. O primeiro salvo com pancadas de forehand e backhand no fundo e no meio da quadra. O segundo com um bom saque. Outro com um saque aberto + backhand cruzado. Outro com uma paralela de backhand que nem ele acreditou. Até que, em uma curtinha nem tão curta seguida de um lob nem tão lob, o serviço é quebrado. Pella saca para o jogo, fecha depois de 2h53min. Bellucci sai, sem o esperado (ou programado?) discurso com o microfone no meio da quadra para agradecer quem ficou até minutos para 01h00 no Ibirapuera se angustiando em sua companhia.


Depois da curva
“Não é fácil ir dormir às três da manhã para jogar no dia seguinte de novo”, disse Bellucci após a derrota. Não deve ser mesmo. E como diz o poeta, não tá fácil pra ninguém.

No mesmo dia em que começou o ATP Challenger Tour Finals, teve início na cidade de São Paulo a segunda fase da Liga Sul-americana de Clubes de basquete. Três dias seguidos com rodada dupla em um quadrangular com três das cinco melhores equipes do Brasil – Brasília, Flamengo e Pinheiros – e um time venezuelano. Os jogos, a serem realizados na sede do clube paulista, foram marcados para 20h e 22h10(!!). Na expectativa de que o jogo de Bellucci, marcado para 21h, pudesse começar sem atrasos e, com o esperado 2 sets a 0, acabar antes de meia-noite, troquei o basquete, que não tinha chance de acabar antes de 00h, pelo tênis. Hoje e amanhã trocarei os dois pela televisão.

Por acaso, durante o jogo que precedia a estreia de Bellucci, Sheila Vieira, Felipe Priante, que neste ano compareceram ao ATP World Tour Finals e aos Jogos Olímpicos, respectivamente, e eu conversávamos sobre um dos motivos que afasta o público de eventos no Brasil: a famosa acessibilidade. A certeza de não apenas chegar ao local de um jogo, show, etc, mas também de conseguir voltar para casa dependendo de transporte público.

Sim, a duração de uma partida de tênis é imprevisível, etc, etc, etc. Um ponto não é problema dos eventos. Esses eventos acontecem e deixam de acontecer. O transporte segue o jogo na cidade durante os demais 364 dias do ano. O primeiro jogo do dia, entre Victor Hanescu e Aljaz Bedene, teve apenas dois sets e durou 2h17min. Tivesse terceiro set ou outro jogo também durasse isso... Uma prorrogação na rodada dupla de basquete, ou apenas um jogo decidido no final, com infinitos tempos técnicos dos dois lados, atrasaria tudo.

Que não se faça drama com um #classemédiasofre. O drama aconteceu em quadra. Fora dela, ficam as opções e escolhas. A de não ir. A de sair antes do final. A de ficar até o final e assumir riscos.

Então volto ao vídeo lá de cima, no momento em que Pella fechou o tie-break do segundo set: 23h40. A debandada do público passa por algumas explicações. Desânimo / frustração com a queda de rendimento de Bellucci. Trabalho cedo no dia seguinte. Residência longe – mesmo de carro ou táxi pode ser um problema. Dependência do transporte público. RÁ! No 4/4 do terceiro set, fiz as fotos abaixo dos locais do Ibirapuera que tinham mais público, que era muito menor do que na partida anterior, marcada para 19h, entre Adrian Ungur e Ruben Ramirez-Hidalgo.



Passada a teoria, vamos à prática. Assumi o risco. Deixei o Ibirapuera 00h47, para um destino perto. Menos de 6 km segundo o Google Maps. Não há estação de metrô perto do ginásio e mesmo se houvesse, não estaria mais funcionando pelo avançar da hora. Andar todo o caminho não parecia uma escolha prudente. Um ônibus e 1h esperando outro... Resolvi passear a pé por quase 2 km pelo cartão postal paulistano (tirando as pessoas que te pedem dinheiro e as que te obrigam a dar dinheiro, uma caminhada na madrugada de SP pode ser agradável. O problema é que na madrugada de SP só está acordado e andando quem vai pedir dinheiro ou te obrigar a dar dinheiro). Enfim, outro ônibus. Cheguei em casa 02h47. Acho que tive sorte. As madrugadas de São Paulo têm sido muito mais dramáticas para outro tanto de família nas últimas semanas. Concordo com Bellucci.

Créditos das fotos não-tiradas com uma mísera câmera digital 12.1 megapixels: Wander Roberto/inovafoto.